segunda-feira, 30 de março de 2009

CineTeatro Raimundo Magalhães

Cine Teatro Raimundo Magalhães
Vila Meã
Memorando justificativo de seu Restauro

Corria o ano de 1950 e já era intensa em Vila Meã a vontade de organizar eventos de índole sócio-cultural que pudessem alegrar o espírito da época, decerto bem marcado pela monotonia de uma vida de muito trabalho sem qualquer contrapartida de lazer ou entretenimento, tal era a escassez quer de recursos financeiros, quer a falta de espaços onde essas actividades pudessem ser desenvolvidas.
Inconformados com a sua já longa tradição de espaço satélite dentro da área municipal, afastados, portanto, dos centros de decisão e daí esquecidos em várias matérias de investimentos públicos, alguns vilameanenses organizaram-se no sentido de, pela via associativa, unirem esforços no sentido de dotarem Vila Meã de actividades onde a tarde de futebol de Domingo não fosse a única alternativa.
Pela mão e, sobretudo, pelo espírito de António Pinto Marques e Esposa, Padre Abel e professor Ribeiro Soares, nasce a Associação de Beneficência de Vila Meã, instituição cujo objectivo fundamental era o de dotar Vila Meã de algumas estruturas de carácter social e cultural, nomeadamente um Grupo de Teatro, os Bombeiros de Vila Meã, e habitações sociais para os mais necessitados, de entre outras.
Trabalhou depressa e bem essa Comissão:
-Organizou-se um grupo de Teatro de Revista o qual começou a fazer as suas actuações em locais improvisados como a "Garagem do Taveira". Deu brado esse grupo de Teatro!
-Elaborou-se um projecto de Estatutos e para o Quartel da futura Associação de Bombeiros, bem como o projecto para um quartel da GNR ( documentos ainda em arquivo ).
-Adquiriu-se terreno para um bairro social.


António Pinto Marques não deixa cair na sonolência o objectivo inicial. Ainda em 1950 partira para o Brasil em busca de apoio financeiro junto da família de Raimundo Pereira Magalhães, ilustre vilameanense, que entretanto falecera. Os filhos deste, bem como a grande maioria dos accionistas das empresas da família Magalhães contribuem generosamente e de tal modo que, sendo o objectivo inicial da viagem a angariação de fundos para a construção de um bairro social, a verba dobrou e tornou possível a concretização do velho sonho de se edificar um Centro de Convívio e Lazer que aí está: CENTRO CÍVICO E CINE TEATRO RAIMUNDO MAGALHÃES.

Iniciada a sua construção em 1954, a obra andou célere. Em 1 de Agosto de 1957, na presença do então Ministro das obras Públicas Engº Arantes de Oliveira, dos fundadores, da família de Raimundo Magalhães representada por quatro de seus filhos vindos do Brasil expressamente para o efeito, autoridades civis e militares da época, procede-se à inauguração desse moderno e belo edifício, de arquitectura peculiar do Estado Novo, desenhado pelo Arquitecto Arala Chaves, especialista na época em edifícios de cine teatro.

Não mais parou a actividade nesse magnífico centro.
Desenvolveu-se a actividade teatral com a criação de um grupo cénico o qual levou à cena diversas peças de revista, sempre inéditas, saídas da imaginação de Carlos Babo com as deixas adequadas à realidade de Vila Meã na época. Foi intensa a participação de famílias inteiras nestes momentos lúdicos. Cada ensaio era uma festa (estávamos nos anos 50) ! Para os jóvens de então, participar no teatro representava a rara oportunidade de passar por momentos de convívio, diversão, namorico,e muita, mas muita, alegria e franca camaradagem.
Veio o cinema. Maravilhosa arte em franco desenvolvimento, puderam os vilameanenses assistir à exibição das melhores fitas até então só acessíveis aos mais afortunados com possibilidades para se deslocarem às casas de cinema dos maiores centros , hoje tão perto, mas na época tão distantes.
E os grandes bailes? Retumbantes, programadas ao pormenor, cativando a presença de jóvens e menos jóvens, verdadeiros pólos de encontro de amigos, pais e filhos sempre entusiasmados no convívio proporcionados por estas festas, as quais atraíam a Vila Meã famílias inteiras de vários concelhos vizinhos.
Mas havia, também, os pequenos bailaricos. Semanalmente, em grupos mais restritos mas certinhos, eles aí estavam a alegrar os finais de tarde de Domingo. Quem por eles passou, estou certo, jamais os esquecerá.
Nâo poderia esquecer as tertúlias vividas quer no bar quer no salão de festas. Quem, dessa época, esqueceu aquele grupo de meninos que nos anos sessenta se convenceu que iria conseguir formar um "conjunto musical" (" Os Quatro a Tenir") e alcançar maior projecção que os Beatles? Bem treinaram!......

Toda Vila Meã se apercebeu da valia deste edifício. A sociedade sabia ( e continua a saber), que pode contar com este nosso espaço para a prossecução de fins meritórios. Sabe também, e isto é importante realçar-se, que nada se cobra em contrapartida.
Bodas de casamentos ou outras, de ricos ou pobres contou sempre com o apoio das instalações do Centro Cívico.
As instituições da área usufruem do espaço para aí desenvolveram as suas acções:
-O Atlético Club de Vila Meã passa, por três décadas consecutivas , a utilizá-las como se fossem suas: Desde a cedência de gabinetes para secretariarem o Club, uso do salão de cinema para as reuniões alargadas, uso do salão de festas para almoços de angariação de fundos e lanches aos jogadores, esta casa foi sempre sua.
-A Casa do Povo de Vila Meã aí teve a sua primeira sede! Gabinete de Secretaria e consultório clínico foi posto à disposição de toda a população. Não fosse esta disponibilidade e a Casa do Povo não teria sido constituida.
-A Junta de Freguesia de Real instalou-se aí, desde 1976 e até 1996.
-A Delegação da Repartição de Finanças foi acolhida, enquanto durou, nas instalações do Centro Cívico, já que uma das condições impostas pela Direcção Geral das Contribuições e Impostos era a de não haver encargos de instalações para poder ser criada essa Delegação.
-Os Grupos Folclóricos de Vila Meã usam-na. Aí realizaram suas actuações, aí realizam seus convívios.
-Os Bombeiros de Vila Meã são fundados por escritura aí lavrada. Recorrem, e são atendidos, aos préstimos deste edifício sempre que o julgam necessário.
-O Externato de Vila Meã sabe ver no Cine Teatro um complemento de instalações sempre disponíveis e usa-as.
-As associações juvenis usam intensamente as instalações:
-Desde a saudosa ASCER ( primeira instituição em Vila Meã a dotar-se de Biblioteca ao dispor da população, fundada em 1970 por jóvens um pouquito inconformados com o marasmo cultural vivido em Vila Meã), passando pelos Grupos de Jóvens das freguesias de Real, Ataíde e Mancelos, os Escuteiros de Real e Ataíde, os Grupos Paroquiais e Comissões de Fábrica das freguesias da área.
-O Club de Caça e Pesca dispõe das instalações sempre que necessita. O Centro Columbófilo de Vila Meã usou-as, anos a fio, semanalmente.
-As emissoras de Amarante aí tem realizado algumas das suas festas de convívio.
- De imediato se cederam as instalações ao Grupo de Amigos do Hospital de Amarante em festas de angariação de fundos.
-Os Partidos Políticos requisitam e usam, idescriminadamente as instalações.
-A Câmara Municipal de Amarante tem no Cine Teatro de Vila Meã um parceiro sempre incondicionalmente disponível; sabe a Câmara apenas necessitar reservar data.

Do exposto se conclui do mérito de tal instituição e de suas instalações.
Poder-se-à afirmar que a Associação de Beneficência de Vila Meã vive voltada para a sociedade. Não descrimina; não repara a quem bem faz; não a tolhe complexos de natureza social; não hesita por questões de bairrismos locais ou municipais; não se inibe por questões de natureza política: recebe com a mesma fidalguia quem exerce o poder ou quem a ele se candidata.

Já lá vão 52 anos sobre a inauguração do Cine Teatro.
O uso intensivo das suas instalações provocaram, naturalmente, o seu desgaste.
Belo pelo seu exterior, de arquitectura característica da época em que foi construído, verdadeiro exemplar da arquitectura do Estado Novo, o seu interior, construído à base de materiais degradáveis pelo uso, torna-o verdadeiramente obsoleto, inestético, desaconchegado, terrivelmente frio no Inverno e insuportavelmente quente no Verão; instalações eléctricas em colapso; telhado e sistema de caleiros completamente arruinados; cadeiras teimosamente iguais, duras, barulhentas e em avançado estado de decomposição permitem-nos classificar de "bravos" os que continuam a usar semanalmente as instalações.

Em 1987, graças à alienação de património, foi possível dar um arranjo exterior ao edifício, recalcado que estava pelas múltiplas afixações de cartazes de propaganda política intempestivamente colocadas pelos partidos em geral, durante os primeiros anos de democracia.

Só a partir de 1990 a instituição começou a receber da Câmara Municipal um simbólico apoio financeiro, como contrapartida pelo facultar das instalações às iniciativas que a Câmara aí passou a desenvolver com alguma regularidade.
Em Novembro de 1996 foi publicado o Dec.Lei que instituía a concessão de incentivos a projectos de recuperação de recintos culturais. Com um prazo limite de apresentação de candidaturas até Fevereiro de 1997, curto como é costume, a instituição redobrou-se em esforços, elaborou o projecto de restauro, o processo de candidatura ficou completo e apresentado atempadamente no Ministério da Cultura. É belo esse projecto! Aguardou-se a decisão do Júri de selecção com aquela ânsia característica daquelas ocasiões em que sentimos que os sonhos de décadas se encontram depositados nas mãos de estranhos que estranham os nossos anseios. Chegou a decisão: maravilha!.... o nosso projecto, o nosso trabalho foi APROVADO, mas ( maldito "mas" ), "infelizmente..... por insuficiência de verbas que pudessem contemplar todas as candidaturas, não poderíamos ser comparticipados porque as mesmas teriam sido absorvidas pelos processos provenientes de capitais de distrito e sedes de concelho". Poderíamos requerer a reapreciação para o ano seguinte; assim fizemos em 1997,1998 e 1999.

Foram muitos os desafios e as promessas para nos apoiarem nesta missão a que metemos obra.
Desafios feitos em público, pelas entidades oficiais, para avançarmos com este projecto. Foi em Dezembro 1991; foi em Dezembro de1995... A esses desafios respondemos com pleno entusiasmo e empenho, realizando a totalidade da missão proposta com muita esperança e na convicção que aos desafios se seguiriam os apoios.
Promessas de ajuda para a execução do projecto de arquitectura, promessas de apoio nos circuitos próprios onde se tomam estas decisões foram várias.
Se, para a primeira promessa, a instituição foi obrigada , mais uma vez, a vender património para satisfazer os compromissos assumidos, já que a promessa falhou, para a segunda continuamos a esperar que a nossa insistente teimosia acabe por dar frutos e, ao menos, sensibilize aqueles em quem depositamos a esperança de nos apoiarem.
Estamos em 2009

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